sábado, 24 de outubro de 2009

As diferentes versões do Construtivismo (1a. parte)

(José Aloyseo Bzuneck)

Através da história da Psicologia Cognitivista o construtivismo apareceu em diversas versões. Prawat (1996) descreveu seis tipos diferentes, entre modernos e pós-modernos (ver também Grandesso, 1998). Para nossos objetivos psicopedagógicos, três versões merecem particular destaque: o construtivismo desenvolvimental, de J. Piaget e de seus seguidores; o socioconstrutivismo originado de Vygotsky e continuado por seus intérpretes; e as teorias de processamento da informação.

Cada uma dessas versões parte de pressupostos filosóficos diferentes e explica de modo peculiar o processo de aprender, em termos de componentes e fatores. Porém, todas assumem por igual o processo de aprendizagem como uma construção ativa do conhecimento.

A seguir serão explorados os tópicos mais característicos de cada versão, atendendo ao objetivo maior que é o de aprimorar os processos de ensino, que contribuam para uma aprendizagem de qualidade.


I - O Construtivismo Desenvolvimental de Piaget

(Epistemologia Genética)


Jean Piaget (1896-1980) interessa-se desde o começo pelas questões epistemológicas - como é possível o conhecimento?; como se pode passar de um conhecimento menor a um maior?; que papel tem o indivíduo no ato do conhecimento? Naquela época, a epistemologia estava dividida
entre os que defendiam que o conhecimento era simplesmente uma cópia da realidade exterior e que era adquirido por meio dos sentidos - empirismo - e os que defendiam que o conhecimento era inato - inatismo. Nesse contexto, Piaget propõe uma terceira alternativa. Defendia que o conhecimento vai sendo construído - não é inato - e que, nessa construção, o indivíduo tem um papel especial - o seu conhecimento não é simplesmente uma cópia da realidade, como os empiristas crêem. Dá uma base empírica às suas preocupações epistemológicas e, por isso, interessa-se pela psicologia, sobretudo àquela que lhe permite seguir o processo de evolução dos conhecimentos ao longo da vida. Aliás, o próprio termo Construtivismo foi por primeiro usado por Piaget em uma entrevista em que discutia seu trabalho e define uma posição epistemológica, no que se refere à origem do pensamento humano (racional).

As principais categorias de sua teoria são: esquemas de ação; estruturas; assimilação e acomodação; adaptação; equilibração; equilíbrios, desequilíbrios e conflitos; estádios do desenvolvimento lógico-cognitivo; papel do ambiente no desenvolvimento lógico-cognitivo.

Principais conclusões educacionais a partir da Teoria de Piaget
(a grande “herança” de Piaget, segundo Emilia Ferrero)

1. Existem os níveis de pensamento ou modos qualitativos de resolver problemas, que correspondem aos estádios piagetianos: pré-operatório, operatório concreto e operatório
formal. Toda criança poderá revelar um desses modos de pensar em casos específicos, ou estar em transição.

2. É uma meta educacional: que todos os alunos atinjam, a seu tempo, os níveis mais altos
de pensamento. Mas essas conquistas não ocorrem de modo espontâneo, como que fatalmente; não existe pré-formismo. E as estruturas cognitivas não são mero produto direto de influências ambientais. A posição de Piaget é interacionista, isto é, para ele, mediante um processo de interação com o seu meio, todo indivíduo ativamente constrói modos mais avançados de pensar, conhecer e resolver problemas. Aí está enfatizada a relevância da atividade mental do aluno.

3. Há meios pedagógicos de se facilitar o processo pelos quais as crianças desenvolvem o pensamento lógico-operatório, até os níveis mais elevados.

4. A estratégia educacional mais importante e universal consiste em fazer a criança pensar,
ou seja, que faça ações (mentais) sobre os conteúdos. Para tanto, professoras e colegas têm a função de provocar desequilíbrios na criança, através de desafios,questionamentos, idéias diferentes etc.

5. No ensino, é preciso ser sensível à criança, entendendo seu modo atual de pensar e resolver problemas. As respostas dos alunos e suas soluções aos problemas sempre devem ser levadas a sério. No momento em que são produzidas, elas fazem muito sentido para o aprendiz, mesmo que pareçam erradas do ponto de vista do professor. Deve-se perguntar aos alunos como chegaram a tais respostas. Isso os ajudará a separar as respostas dadas para agradar a professora das respostas que são dadas como resultado de uma compreensão genuína ou de algum al-entendido. A partir do que se souber acerca do pensamento da criança, pode-se prosseguir no trabalho de desafiá-la sucessivamente.

As provas piagetianas para avaliação cognitiva

O modo como uma criança pensa, de forma lógica-operatória, ou pré-operatória, é um processo psicológico interno, subjetivo, não observável diretamente. Piaget desenvolveu testes que funcionam como uma espécie de “raio-x psicológico”, destinados a identificar o modo qualitativo de as crianças pensarem. Foi assim que ele obteve os dados básicos para a formulação de sua teoria cognitivo-desenvolvimental. Assim,um teste poderá concluir que uma dada criança revela, em certo conteúdo, um modo de pensar que poderá ser ou pré-operatório, ou operatório concreto, ou em transição entre essas duas fases. O mesmo vale para se testar a transição do operatório concreto para o formal.

As crianças do ensino fundamental devem estar entrando ou já se consolidando nos modos de pensar operatório concreto, até com sinais de operatório formal. Por isso, pode ser útil – dentro de certos limites – averiguar como essas crianças raciocinam diante de problemas, que são os testes piagetianos. O critério fundamental de que alguém pensa de modo operatório é ter a noção de conservação. Por isso, vale a pena conhecer alguns desses testes entre os quais, a título de exemplo, podem ser citados os seguintes.

1. Seriação, ou ordenação segundo grandezas crescentes ou decrescentes.

2. Classificação operatória

3. Conservação de número, de quantidades discretas etc.

Entretanto, são necessárias algumas cautelas ao se pretender avaliar as crianças na escola, com as provas piagetianas, a título de diagnóstico cognitivo. Tal avaliação, além de não captar necessariamente toda a estrutura cognitiva de uma criança, revela apenas o que ela aqui e agora é ou possui (C. Coll; E. Ferrero). É provável que, logo a seguir, ela construa uma forma superior de pensamento, inclusive em função da própria participação na situação de teste. Portanto, não se deve concluir definitivamente que a criança é préoperatória ou operatória mediante a aplicação de um teste, mas que ela, agora, com essematerial específico, apresenta uma resposta característica de um nível ou outro de pensamento, ou que ela está em fase de transição. Esse conhecimento sobre a criança, porém, tem grande utilidade para o delineamento imediato de estratégias de intervenção.

Além disso, considere-se que há variáveis que podem limitar os avanços cognitivos e/ou camuflar a verdadeira estrutura cognitiva subjacente; daí pode surgir o falso negativo.

Imaturidade biológica
Inteligência psicométrica (QI)
Grau de familiaridade com os materiais
Desenvolvimento da linguagem
Processos de atenção na hora da prova; e motivação para fazer aquele dado teste, naquele momento.

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"O objetivo da educação não é o de transmitir conhecimentos sempre mais numerosos ao aluno, mas o de criar nele um estado interior e profundo, uma espécie de polaridade de espírito que o oriente em um sentido definido, não apenas durante a infância, mas por toda a vida”



(Durkheim)